sexta-feira, 8 de maio de 2015


A CPT tornam públicos os dados de conflitos ocorridos no campo no Brasil, no ano de 2014

A CPT tornam públicos os dados de conflitos ocorridos no campo no Brasil, no ano de 2014. Confira abaixo as informações:
 



Mais informações:

Cristiane Passos (62) 4008-6406 / 8111-2890 / 9268-6837
Elvis Marques – (62) 4008-6414 / 8444-0096
Antônio Canuto (62) 4008-6412 
 

Carta Política do 1º Mutirão de Povos e Comunidades Tradicionais

Carta Política do 1º Mutirão de Povos e Comunidades Tradicionais

 
1º Mutirão de Povos e Comunidades Tradicionais aconteceu no Território Indígena Xakriabá - Aldeia Brejo Mata Fome, município de São João das Missões, em Minas Gerais. O Encontro ocorreu entre os dias 17 e 19 de abril. Confira a Carta do Encontro: 


(Fonte: ASA Brasil)
Depois de discussões que ocorreram no 1º Mutirão de Povos e Comunidades Tradicionais, que aconteceu no Território Xakriabá nos dias 17, 18 e 19 de abril com a participação de indígenas da etnia Xakriabá e Krenak, Vazanteiros, Quilombolas, Geraizeiros, Catingueiros, Apanhadores de Flores Sempre Viva e o MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, os participantes chegaram ao entendimento de que a principal luta e a principal bandeira de todos os povos é a defesa dos territórios tradicionais.
A defesa pelo território sempre fez parte da luta dos Povos e Comunidades, e apesar das diferenças culturais existentes entre eles é possível perceber que as lutas são as mesmas, e por isso é preciso fortalecer e preservar as alianças entre os grupos. O mutirão teve a importante participação de representantes do Governo, da Secretaria de Desenvolvimento Agrário, de representantes da Secretaria do Patrimônio da União e da Comissão dos Direitos Humanos, além de membros da Fundação Nacional do índio (Funai) e pesquisadores de diversas universidades do país.

Leia a Carta Política do Encontro abaixo ou faça o downloads do documento no fim da página:  

CARTA POLÍTICA DO I MUTIRÃO DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS NO TERRITÓRIO XAKRIABÁ – MG
Reunidos e reunidas, entre os dias 16 a 19 de abril de 2015, na Terra Indígena Xakriabá, Aldeia Brejo Mata Fome, em São João das Missões - MG, no I Mutirão dos Povos e Comunidades Tradicionais, com o tema “Aliança e Mobilização em Defesa dos Direitos Constitucionais”, nós, representantes de Povos e Comunidades Tradicionais (indígenas Xakriabá de São João das Missões, Xakriabá de Cocos - BA e Krenak, Quilombolas, Vazanteiros, Geraizeiros, Veredeiros, Caatingueiros e Apanhadoras(es) de Flores Sempre-vivas), de organizações e movimentos sociais, pastorais, organizações de apoio e assessoria e de núcleos de estudos e pesquisas, declaramos:
Nossa indignação:
· com a extrema morosidade e falta de interesse político com o processo de regularização dos territórios indígenas;
· com a lentidão da regularização dos territórios quilombolas, que contribui com a perpetuação do trabalho escravo, mesmo após 127 anos da declaração de sua extinção;
· com o fato de que, até hoje, as Comunidades Tradicionais, que contribuíram com a construção e referência da nacionalidade brasileira, não foram contempladas com um marco jurídico que reconheça e regularize os seus territórios;
· com a continuidade de vultosos subsídios, diretos e indiretos, promovidos pelo Estado para o avanço dos grandes projetos de criação de gado, monoculturas, mineração, associados com grandes obras de infraestrutura como a de barragens e hidrelétricas, provocando uma contínua desestruturação das economias e dos territórios das Comunidades Tradicionais, em particular nos cerrados brasileiros, o que pressupõe um verdadeiro assalto contra a rica agrobiodiversidade e sociodiversidade brasileiras;
· e repúdio com a decisão liminar do juiz federal Adverci Rates Mendes de Abreu, titular da 20° vara do Distrito Federal, que determinou à FUNAI a imediata suspensão do processo administrativo de identificação, delimitação e ampliação da Terra Indígena Xakriabá, em ação proposta pelo prefeito municipal de Itacarambi Ramon Campos (processo n° 10917- 73. 2015. 4. 01. 3400);
· e repúdio ao projeto de emenda à Constituição (PEC 215).
Denunciamos:
· que até hoje a proposta de Educação do Campo pouco avançou no âmbito das políticas públicas municipais e estaduais, o que impede o estímulo à permanência da juventude no campo;
· que a destruição da sócio-bio e agrodiversidade se acentua continuamente;
· que os ecossistemas dos rios e outros sistemas aquáticos são bloqueados e poluídos, criando danos para as Comunidades Tradicionais que vivem destas fontes;
· a criminalização e o assassinato de lideranças por antagonistas nas lutas em defesa dos interesses, das causas e das comunidades que representam;
· a constante violação de direitos e criminalização das práticas dos Povos e Comunidades Tradicionais;
 · que as condições de produção e trabalho não estão sendo mantidas, sobretudo pela falta de acesso a terras agricultáveis ou mesmo de terras de uso comum para agroextrativismo e criação;
· que a justiça não tem sido imparcial em suas decisões, muitas vezes assumindo caráter ideológico contra os direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais;
· que instituições estatais de meio ambiente expulsam Povos e Comunidades Tradicionais de seus territórios, com a criação de unidades de conservação de proteção integral, gerando prejuízos para a biodiversidade local, sem entender que estes territórios são ecologicamente ricos por estarem sendo utilizados e cuidados, há várias gerações, pelas comunidades tradicionais.
Reiteramos:
· que o Brasil assinou a OIT 169, ratificada por meio do Decreto n0 5.051, que obriga o Estado a proteger os Povos e Comunidades Tradicionais;
· que o Brasil assinou a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, ratificada pelo Decreto n0 6.177;
· que os artigos 215 e 216 da Constituição Federal de 1988, garantem um estado multicultural e multiétnico, bem como a proteção de todos os grupos formadores do processo civilizatório nacional, incluso sua cultura imaterial;
· que os artigos 231 e 232 da Constituição Federal garantem os direitos indígenas;
· que o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias garante os direitos territoriais das comunidades quilombolas;
· que o decreto 6040 criou a Política Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais e a Lei nº 21.147 instituiu a Política Estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais;
· que o Brasil assinou os documentos da ECO’92, que definiram para os Povos e Comunidades Tradicionais um papel vital para o desenvolvimento sustentável e que a sua promoção cabe ao Estado.
Constatamos:
· que todas as obrigações internacionais, constitucionais e jurídicas assumidas pelo Brasil vêm sendo constantemente negligenciadas e que todas as políticas e programas públicos criados pelo próprio governo brasileiro não têm sido priorizados.
Assim, as organizações dos Povos e Comunidades Tradicionais reunidas no I Mutirão dos Povos e Comunidades Tradicionais exigem dos governos federais, estaduais e municipais de forma ampla:
1. A conclusão, nos próximos 10 anos, da regularização dos territórios indígenas;
2. A conclusão, em uma geração (ou seja, meio século depois da proclamação da Constituição Federal de 1988), a regularização de todos os territórios quilombolas. Isso significa que a cada ano devem ser regularizados entre 150 e 160 territórios quilombolas no Brasil;
3. A suspensão de todas as formas de subsídio, de forma direta ou indireta, para as economias destruidoras da sócio e biodiversidade brasileiras;
4. Que não sejam mais criadas Unidades de Conservação de Proteção Integral sobre territórios tradicionais e que sejam recategorizadas as Unidades de Proteção Integral existentes, que impactam os territórios tradicionalmente ocupados e que comprometem os modos de vida e a sustentabilidade desses povos e comunidades;
5. Que o Estado compense os Povos e Comunidades Tradicionais por prejuízos resultantes de esbulho de seus territórios tradicionais, danos ambientais, bem como pela preservação de ecossistemas e biomas como guardiões da biodiversidade;
6. Que nenhuma obra ou empreendimento seja implementado em território tradicional sem o consentimento prévio dos Povos e Comunidades Tradicionais historicamente ocupantes;
7. Que o Estado brasileiro tome providências no sentido de assegurar os direitos territoriais, a partir da aprovação de projetos de lei em curso, construção de dispositivos, instruções normativas, itinerários técnicos e garantias de sustentabilidade produtiva e territorial para os Povos e Comunidades Tradicionais;
8. Que seja efetivada a Lei nº 21.147, de 14 de Janeiro de 2014, que institui a Política Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais em Minas Gerais, bem como criada instância de controle social ou Comissão de caráter paritário e deliberativo, composta por representantes do poder público e dos povos e das comunidades tradicionais, prevista no seu art. 8°.
9. Que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal elaborem uma legislação que reconheça e proteja os territórios das Comunidades Tradicionais.
Demandamos especificamente:
1. Implementação imediata da RDS Nascentes dos Gerais, localizada nos municípios de Montezuma, Rio Pardo de Minas e Vargem Grande do Rio Pardo;
2. Atendimento às reivindicações de Povos e Comunidades Tradicionais pelo MMA/ICMBio, de criação ou regularização fundiária de reservas extrativistas (RESEX) e de desenvolvimento sustentável (RDS), nos biomas: Cerrado: Resex Sempre Viva, Lassance/MG; Resex Serra do Múquem, Corinto/MG; Resex Barra do Pacuí, Ibiaí/MG; Resex Três Riachos, Santa Fé de Minas/MG; RDS / Resex Serra do Alemão, Buritizeiro/MG;- Resex Curumataí, Buenopólis/MG; e o decreto de criação das RDS Tamanduá/Poções, Riacho dos Machados/MG;
3. Reconhecimento e demarcação do território das Comunidades Tradicionais, com prioridade para o caso de grupos ameaçados pela mineração e por grandes empresas do complexo siderúrgico de Minas Gerais, como ocorrem no território tradicional das comunidades geraizeiras da região do Alto Rio Pardo, Grão Mogol (Vale das Cancelas), Riacho dos Machados, Rubelita, Fruta de Leite e Novo Horizonte;
4. Publicação imediata do decreto de ampliação da TI Xakriabá e sua imediata homologação;
5. Criação imediata do grupo de trabalho de identificação e delimitação do Território Indígena Xakriabá de Cocos-BA;
6. Regularização dos Territórios de Comunidades Tradicionais de Apanhadoras(es) de Flores Sempre-vivas que estão sendo expropriadas, principalmente por Unidades de Conservação de Proteção Integral (Federais e Estaduais), mas, também, por Empreendimentos Minerários e de Plantios de Eucalipto, em que está inserido o Mosaico de Unidades de Conservação da Serra do Espinhaço – Região de Diamantina, Minas Gerais. No caso específico, a recategorização imediata do Parque Nacional das Semprevivas como Reserva de Desenvolvimento Sustentável – RDS;
7. Regulamentação da Atividade do Extrativismo das Flores e outros Produtos Vegetais Não Madeireiros (extração, manejo e comercialização);
8. Agilidade nos processos de desapropriação visando a desintrusão de fazendeiros nos territórios quilombolas, como no caso do quilombo de Gurutuba (MG), e demarcação dos territórios quilombolas de Vargem do Inhaí e Mata dos Crioulos em Diamantina – MG.
9. Emissão imediata da Certidão de auto-declaração como comunidade quilombola à Comunidade de Raiz, município de Presidente Kubitschek – MG, pela Fundação Cultural Palmares;
10. Reconhecimento e regularização de territórios de comunidades vazanteiras do São Francisco através de ações conjuntas envolvendo a SPU – IEF – INCRA, com o imediato encaminhamento, para a Assembleia Legislativa, do projeto lei que diz respeito à desafetação das áreas que fazem parte do território das Comunidades Vazanteiras do Pau 5 Preto (Parque Estadual Verde Grande-Matias Cardoso) e Pau de Légua (Parque Estadual da Mata Seca-Manga), Norte de Minas Gerais;
11. Suspensão da ampliação do Parque Estadual do Peruaçu e transformação da área pretendida como Reserva de Desenvolvimento Sustentável;
12. Manutenção da paralisação da Barragem do Berizal até que seja executado um Plano Nacional de Revitalização da Bacia do Rio Pardo, nos estados de Minas Gerais e Bahia, garantindo a recuperação das áreas de recarga, nascentes e ribeirões que formam este importante rio brasileiro nos municípios da região do Alto Rio Pardo;
13. Suspensão dos processos de licenciamento de PCHs na bacia do Rio Carinhanha, nos estados de Minas Gerais e Bahia;
14. Que o Estado não seja omisso nos conflitos territoriais, como nos casos de Brejo dos Crioulos, Gurutuba, Ilha da Capivara, Parques estaduais e federais; e a criminalização ocorrida com o movimento geraizeiro e sua liderança Orlando dos Santos;
15. Que seja imediatamente suspensa a tramitação no Senado Federal da PEC 53, que propõe revogar o inciso VII do Art. 20 da Constituição Federal e o parágrafo 3 do Art. 49 dos Atos das Disposições Transitórias, propondo extinguir o instituto do terreno de marinha, uma vez que abre brechas para titulação de terras griladas por grandes fazendeiros e empresários;
16. Garantir recursos para que a SPU de Minas Gerais possa estabelecer convênio com as instituições de pesquisa que atuam na região (UNIMONTES, UFVJM, UFMG), no sentido de aprimorar ainda mais a metodologia de demarcação dos terrenos marginais, visando à defesa de contestações técnicas e a execução compartilhada do projeto de demarcação do rio São Francisco no Norte de Minas;
17. Incluir nos estudos e relatórios de demarcação o perfil antropológico e/ou socioambiental das comunidades tradicionais beneficiadas com o Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS);
18. Acelerar os procedimentos de titulação das comunidades quilombolas já certificadas pela Fundação Palmares priorizando o território quilombola Nativos do Arapuim, município de Verdelândia-MG, que sofreu uma tentativa de chacina em 19 de janeiro de 2014;
19. Dar destinação constitucional às terras devolutas para fins de reforma agrária, titulação de territórios tradicionais e criação de unidades de conservação de uso sustentável, conforme previsto na legislação federal e estadual;
20. Acelerar a demanda de realização do laudo antropológico da comunidade quilombola de Praia, no município de Matias Cardoso, Buriti do Meio em São Francisco e e Quilombo de Campos em Serranópolis de Minas;
21. Verificar e dar os devidos encaminhamentos jurídicos ao processo de grilagem de terras em território geraizeiro, nos municípios de Indaiabira e São João do Paraíso;
22. Que seja implementado um plano de desenvolvimento de todos os assentamentos e assentados, contemplando ações de infraestrutura, direitos básicos e assistência técnica;
23. Fortalecimento da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em termos de estrutura, recursos humanos e ações indigenistas de base;
24. Que sejam punidos com rigor os assassinos e agentes agressores dos Povos e Comunidades Tradicionais, que continuam impunes e ameaçando constantemente lideranças e seus apoiadores.

Assinam esta carta:
1. Povos Indígenas Xakriabá de São João das Missões, Xakriabá de Cocos - BA, Krenak, Povos Quilombolas, Comunidades Tradicionais Vazanteiras, Geraizeiras, Veredeiras, Caatingueiras e Apanhadoras(es) de Flores Sempre-vivas
2. Articulação Rosalino de Povos e Comunidades Tradicionais do Norte de Minas
3. Conselho Nacional de Extrativistas
4. Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras
5. Movimento Geraizeiro
6. Vazanteiros em Movimento
7. Comissão em Defesa dos Direitos das Comunidades Extrativistas – CODECEX
8. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
9. Comissão Pastoral da Terra – CPT
10. Conselho Indigenista Missionário – CIMI
11. Movimento Pastoral dos Pescadores de Pedra de Maria da Cruz – MPP
12. Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Capitão Enéias, de Rio Pardo
13. Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas – CAA\NM
14. Cáritas Diocesana de Januária
15. NIISA – Núcleo Interdisciplinar de Investigação Socioambiental – UNIMONTES
16. OPARÁ – Grupo de Estudos e Pesquisas do São Francisco – UNIMONTES
17. NAC – Núcleo de Estudos em Agroecologia e Campesinato – UFVJM
18. Rede Matas Secas (Tropi Dry Brasil)

Terra Indígena Xakriabá, Aldeia Brejo Mata Fome – São João das Missões / MG, 18 de abril 2015.

Brasil - Decisão sobre transgênicos: consumidores serão impedidos de saber o que compram

Segurança alimentar
07.05.2015
Notícia com vídeo relacionadoDecisão sobre transgênicos: consumidores serão impedidos de saber o que compram

Marcela Belchior
Adital
Representando grave retrocesso ao direito do consumidor, acaba de ser aprovado o Projeto de Lei nº 4148/2008, que dispensa a indústria alimentícia de informar o consumidor sobre a presença de transgênicos nos produtos que oferece, por meio do símbolo T em amarelo. Em favor da liberdade dos grandes produtores não avisarem o real conteúdo que disponibilizam nas prateleiras e aumentarem suas vendas, tal medida pode deixar a população brasileira passível de consumir produtos, como milho, soja, arroz, óleos, margarinas e fubá, sem saber se não seguros ou não.

reproducao
O símbolo T em amarelo é, atualmente, utilizado nos rótulos para informar sobre produtos transgênicos. Foto: Reprodução.


Na Câmara Federal, o debate e a votação sobre o fim da exigência do rótulo, ocorridos no último dia 28 de abril, colocaram em oposição deputados da bancada ruralista e defensores do meio ambiente, que argumentaram que o projeto retira o direito do consumidor de saber o que está comprando. Para o deputado Alessandro Molon (Partido dos Trabalhadores – PT – Rio de Janeiro), o Projeto de Lei cassa, na prática, o direito de o consumidor saber se há ou não transgênicos. "É correto sonegar ao consumidor essa informação? Está certo tirar o direito de saber se tem ou não transgênicos?”, questionou.
O líder do Partido Verde (PV), deputado Sarney Filho (do Maranhão), disse que o projeto é um retrocesso na legislação atual. "Quero alertar que esse projeto visa a diminuir o nível de informações que existe hoje. Ele não está acrescentando nada; ele está retirando o direito do consumidor de saber que produto está levando para a sua casa”, afirma. Na opinião do deputado Padre João (PT de Minas Gerais), a proposta só beneficia as grandes multinacionais do setor agropecuário, que vendem sementes transgênicas. "Não podemos ficar a serviço das grandes empresas, devemos ter respeito pelo consumidor”, disse.
Ainda sem consenso no Plenário da Câmara, o PL de autoria do deputado federal Luiz Carlos Heinze (Partido Progressista – PP – Rio Grande do Sul) foi aprovado por 320 votos a favor e 135 votos contrários. Depois da Câmara, a matéria deve passar pelo crivo do Senado Federal, pela sanção da Presidência da República e, só então, poderá entrar em vigor em forma de lei. Confira como votou cada deputado. Heinze é um parlamentar reconhecido pela defesa do direito do agronegócio e dos ruralistas. Em 2013, um vídeo mostra o deputado incitando ruralistas a agirem com violência contra indígenas e quilombolas.
Veja o vídeo:
<iframe width="420" height="315" src="https://www.youtube.com/embed/PjcUOQbuvXU" frameborder="0" allowfullscreen></iframe>
O que diz a proposta
Na prática, o projeto revoga o Decreto nº 4680/2003, que já regulamenta o assunto. De acordo com o texto aprovado, nos rótulos de embalagens para consumo final de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal, deve ser informada ao consumidor a presença de elementos transgênicos em índice superior a 1% de sua composição final, se detectada em análise específica. A redação do projeto deixa de lado a necessidade, imposta pelo Decreto, do consumidor ser informado sobre a espécie doadora do gene no local reservado para a identificação dos ingredientes.

foto-gustavo_lima
Autor do projeto, deputado Luis Carlos Heinze propõe lei que atenta contra direitos do consumidor. Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados.

A informação escrita sobre a presença de transgênicos deve atender ao tamanho mínimo da letra, definido no Regulamento Técnico de Rotulagem Geral de Alimentos Embalados, que é de 1 milímetro. Além do fim do símbolo que identifica os produtos com transgênicos, no caso dos alimentos que não contenham os chamados Organismos Geneticamente Modificados (OGM), o projeto mantém a regra do atual decreto, que permite o uso da rotulagem "livre de transgênicos”.
Um destaque do PT e aprovado pelos deputados retirou do texto a condição de que esses produtos sem transgenia somente possam usar a rotulagem se não houver similares transgênicos no mercado brasileiro. O texto continua a exigir, entretanto, a comprovação de total ausência de transgênicos por meio de análise específica, o que pode dificultar o exercício desse direito pelos agricultores familiares, que teriam de pagar a análise para poderem usar a expressão. Conheça a íntegra do Projeto de Lei.

foto-luiz-macedo
Sessão plenária em que parlamentares disseram "sim” ao fim da rotulagem. Foto: Luiz Macedo/Câmara dos Deputados.


Em entrevista à Adital, o sociólogo Rubem Siqueira, membro da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), observa que o Congresso Nacional não tem apresentado posicionamentos que favoreçam a população nem a democracia. "Estamos reféns de um Congresso antipovo, totalmente capturado pelo capital”, destaca. "Em sã consciência, é fundamental uma mínima informação sobre algo que você livremente consome e paga por isso. Negar isso é um absurdo sem tamanho”.
"Na verdade, estamos passando, neste momento, por uma deslegitimação da política. Para que serve a democracia, voto, mandato, se os políticos não têm compromisso com o povo?”, questiona Siqueira. Agora, na opinião do coordenador da CPT, é preciso grande mobilização da população, principalmente representada pelos movimentos organizados, para que vá para as ruas alarmar sobre a gravidade da proposição que se encaminha à votação no Senado Federal.
"Sabemos que os senadores também são financiados pelo meio, mas esperamos que entre eles haja um pouco mais de bom senso. Temos que nos mobilizar, aproveitar até mesmo para discutir o que é essa agricultura que cresce, que é estratégica para esse tipo de desenvolvimento decommoditiesagrícolas, à base da completa destruição ecológica”, disse Siqueira.
Campanha contra proposta
Como a proposta ainda terá de passar por outras instâncias para virar lei, ainda há tempo de dissuadir os parlamentares. A campanha "Fim da rotulagem dos alimentos transgênicos: diga não!” chama a população a pressionar os senadores a se sensibilizarem para a gravidade da questão, enviando mensagens e debatendo o tema.
A campanha argumenta que desobrigar a informação sobre a presença de transgênico no rótulo, se não for possível sua detecção pelos métodos laboratoriais, exclui a maioria dos alimentos, como papinhas de bebês, óleos, bolachas e margarinas. Além disso, alerta que a proposta não especifica a quem compete fazer a detecção nem a fiscalização da presença de ingredientes transgênicos; e deixa de lado a necessidade do consumidor ser informado sobre a espécie doadora do gene no local reservado para a identificação dos ingredientes.
Depois de tentar um diálogo com os deputados, a mobilização, agora, pede a rejeição do Projeto por parte dos senadores, já que fere o direito à escolha e à informação, assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor, prejudica o controle adequado dos transgênicos, viola o direito dos agricultores e das empresas alimentícias, que optam por produzir alimentos isentos de ingredientes transgênicos, e descumpre compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no âmbito do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança. Saiba mais sobre a campanha aqui.

divulgacao
Campanha trabalha para que parlamentares rejeitem projeto. Foto: Divulgação.


(com informações da Câmara dos Deputados e Agência Brasil)
Leia também
Campanha exige manutenção de informação sobre alimentos transgênicos em produtos
Estados Unidos retira oposição à regularização de rotulagem de alimentos transgênicos
Camponeses ocupam Comissão de Biossegurança contra liberação de transgênicos

Marcela Belchior

É jornalista da Adital. Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), estuda as relações culturais na América Latina.
E-mail:
marcela@adital.com.br
belchior.marcela@gmail.com

Vejam uma analise de conjuntura politica brasileira, razoável, por José Domingues, na revista do Ibase

A CONJUNTURA EM DUAS DURAÇÕES: DA CRISE À DISPUTA DO FUTURO
(Publicado em Trincheiras, revista do IBASE, no. 1, 2015)
José Maurício Domingues

I. Seria difícil, há cerca de dois anos, supor que o Brasil estaria enfrentando uma conjuntura tão intricada. Em que pesem impasses e limitações do projeto que há mais de uma década conquistou o governo federal, para o campo da esquerda se podia imaginar possibilidades de avanço que parecem haver-se esfumado no horizonte. Este artigo se remete assim a duas durações da conjuntura, vinculadas entre si. Uma mais curta, ligada à grande opacidade e confusão do período pós-eleitoral, que se desdobra velozmente, a outra enfatizando questões estratégicas, mais de longo prazo, mas que remetem ao tempo presente.

II. Não haveria como negar que o momento atual é bastante difícil e que se evidencia uma grave deterioração das condições políticas do governo de Dilma Rousseff. A campanha da candidata do PT optou por um discurso claramente à esquerda, mobilizou militantes ante a possibilidade de vitória da centro-direita representada por Aécio Neves e ofereceu uma perspectiva de avanços sociais e políticos. No entanto, o clima de estelionato eleitoral que se instalou desde que a equipe econômica foi nomeada, chefiada pelo neoliberal Joaquim Levy, tem imposto um custo político altíssimo à candidata reeleita, ao mesmo tempo em que os setores liberais e conservadores conseguem se fortalecer. Dilma escamoteou os graves problemas da economia brasileira hoje e propôs remédios, para males menores, que seriam o oposto do ajuste fiscal em curso, que inclui um ataque a certos aspectos das políticas sociais, com o descarte dos projetos e dos economistas desenvolvimentistas que marcaram seu primeiro mandato, cujas avaliações preliminares são críticas e pessimistas, como seria de esperar. É inevitável lembrar dos fins melancólicos do Plano Cruzado e do Plano Real, que deram, respectivamente, a vitória esmagadora ao PMDB nas eleições para o Congresso Constituinte e governadores na década de 1980 e a reeleição de Fernando Henrique Cardoso pelo PSDB na de 1990, para depois os afundarem ao se desmancharem logo após os pleitos. Resultado: o PMDB acabou por jamais eleger um presidente da república, sendo Fernando Collor de Melo sufragado vencedor na primeira eleição direta desde o fim do regime militar, no segundo caso cabendo a Luís Inácio Lula da Silva recolher os cacos do governo de Cardoso. O ministério, as trapalhadas e a melancolia que cercam a figura pós-eleitoral de Dilma Rousseff antecipam de certa maneira esse desfecho, embora ele não seja inexorável.

O contexto se agrava com a crise da Petrobrás e a Operação Lava Jato, que engolfa grande parte do sistema político e é dirigida pela mídia contra o governo Dilma e o PT, cujas divisões internas são neste momento agudas. O mal-estar social que explodiu nas ruas em 2013 desde então somente piorou, sem que o sistema político em nada se tenha feito mais poroso a um tecido social cada vez mais autonomizado politicamente e bastante avesso aos grandes aparatados burocráticos dos partidos e do estado (que cada vez mais tendem a se confundir). O desemprego, que já acossa São Paulo e inevitavelmente crescerá como resultado da política econômica, somado à ameaça de crises da água e da energia, especialmente no centro-sul, azedará mais os espíritos. As manifestações dos dias 13 (promovidas pelo MST, CUT e UNE) e 15 de março (promovidas sobretudo pela grande mídia, pelo PSDB e movimentos conservadores e mesmo reacionários) subiram a temperatura e foram claramente favoráveis às forças da direita, em seus diversos matizes. Se isso resultará em explosões massivas mais adiante é ainda questão em aberto.

Nada diz que a história se repetirá, ela está aberta a intervenção criativa das forças políticas. Neste momento, todavia, não se delineia uma saída positiva e pela esquerda para a crise. É patente o desgaste precoce do segundo governo Dilma e do PT mais geralmente, por questões econômicas e pela corrupção, bem como pelo esgotamento de seu projeto centrado no combate à pobreza e na expansão do mercado, com uma tentativa de evitar conflitos políticos e distributivos mais sérios, que agora batem a suas portas. Será a incapacidade do PSDB de aproveitar-se da fragilidade dos governos capitaneados pelo PT superada? A plausibilidade de uma resposta negativa a esta indagação e a pressa em retomar o poder podem consolidar um tipo de golpismo que evita ainda explicitar-se. Marina Silva pode até ressurgir, mas seus equívocos e apoio final a Neves a converteram em figura prosaica, com sua Rede agora em frangalhos. Por outro lado, o PSOL está longe de configurar-se como alternativa nacional de poder, sem pauta muito clara e com um funcionamento interno em que a mobilização e incorporação da população ao cotidiano da política não figura centralmente, reproduzindo assim tradicionais vícios das esquerdas partidárias. O PSB, finalmente, foi neutralizado em larga medida por sua aliança com o PSDB. Um partido ao estilo do “Podemos” espanhol se mostra muito improvável, de todo modo, no cenário brasileiro, ao menos por ora.

Não era inevitável, mas a política nacional inclinou-se à direita. Para alguns, isso é inclusive, em parte, resultado das manifestações de 2013, expressando-se inclusive em uma nova composição do Congresso, mais conservadora, o que se prova pela eleição de Eduardo Cunha como presidente da Câmara dos deputados. Se a última constatação é um tanto exagerada (segundo as análises do NECON, do IESP-UERJ, as coisas pioraram levemente na Câmara, melhorando ligeiramente no Senado, embora as bancadas sindicais do PT de São Paulo tenham sido duramente atingidas), a ascensão do famigerado deputado se explica antes por razões corporativas e pelas fragilidades, substantivas e de articulação, do governo Dilma. De modo mais geral, é preciso afastar uma visão equivocadamente estática da política. A energia liberada pela eclosão daquelas jornadas de rua não tinha direção definida. Era o próprio comportamento dos demais agentes na conjuntura que podia – e ainda pode –, combinando e alterando os vetores em ação, definir sua resultante ou resultantes múltiplas. A verdade é que as respostas do governo e do PT às manifestações de 2013 foram para lá de insuficientes, agravadas por uma campanha eleitoral bastante manipulativa, seguida do abandono de muitas promessas e de erros táticos seguidos por parte da esquerda – seja no governo, seja fora dele. A indefinição continua sendo a marca do momento atual, mas a ruptura das promessas governamentais e seus inexoráveis resultados nos próximos meses, além de erros de toda sorte, tende a inviabilizar a sedução de uma base (sobretudo quando jovem) que vê neste tipo de manobra a encarnação do cinismo típico dos políticos profissionais, com por outro lado a base social da direita crescendo e seu discurso encontrando mais legitimidade, embora esses dois fatores não tenham necessariamente que confluir. Na verdade o mais grave é que a parte dominante da esquerda está sem rumo e seus outros setores tampouco estão em condições de dirigir o país. Talvez o avanço da direita acabe por desencadear um movimento à esquerda mais forte adiante, em defesa da democracia e das conquistas das últimas décadas. Mas não há como evitar constatar a dramaticidade do momento atual.

Quais cenários se podem delinear daqui para frente? O primeiro, mais simples, pautar-se-ia por uma duração mais curta da crise e do ajuste econômico, com rápida retomada do crescimento – com mais espaço para os investimentos privados e menos expansão do consumo, caso funcione a reorientação a que se propõe o segundo governo Dilma, superando as desconfianças dos empresários. Ao mesmo tempo, o PT, Lula e a presidenta (cujas relações parecem péssimas neste momento) se recomporiam, firmando-se a candidatura daquele em 2018 mais uma vez à presidência. Para completar o panorama, a ascensão da direita se interromperia, com os processos do caso Petrobras mantendo-se longe do governo e pouco atingindo o PT. Não se apresenta hoje de modo algum como o mais provável. O segundo cenário teria o PSDB como protagonista principal, com tentativas contundentes de impeachment, na crista dos protestos de rua. Mas a agenda claramente neoliberal e a postura “elitista” do partido, apesar do apelo de suas denúncias contra a corrupção, não lhe têm favorecido. Há que se ver como a crise geral e o descrédito do sistema político, bem como a própria Operação Lava Jato, o atingirão. O PSOL pela esquerda e Marina pelo centro não aparecem como prováveis intérpretes robustos dos descontentes com a crise. Um terceiro cenário com isso se põe, com um candidato que repita o fenômeno Collor roubando a cena nas próximas eleições, distantes é verdade, mas para as quais desde já se posicionam as forças políticas (inclusive aquelas que se mantêm recolhidas). Enfim, é possível uma evolução mais complexa, que renove e reposicione a esquerda, ainda que a curto e médio prazo as coisas estejam para lá de complicadas.Vale frisar que a evolução da política nacional se realiza contra o pano de fundo de uma nova situação geopolítica. A virada do milênio assistiu ao chamado giro à esquerda na América Latina. Modesto em seus resultados, remando contra a maré global, ele significou a implantação de um social liberalismo de cunho progressista, tendo em seu centro políticas de equidade que suavizaram de forma humanitária e economicamente estimulante as agruras das massas de miseráveis da região mais desigual do mundo, por vezes implicando em mais centralidade do estado na coordenação da vida econômica e um distanciamento dos ditames mais severos do capital financeiro, sem que a igualdade propriamente haja sido buscada. Esse giro atingiu seus limites e, finda a bonança das commodities e a fartura de recursos que proporcionou durante a década de 2000, somente enfrentamentos sociais distributivos mais aguçados poderiam permitir que retomasse seu ímpeto, levando a políticas sociais mais universalistas e custosas, bem como a uma mudança mais decidida de modelo econômico. A esquerda latino-americana carece dessa força no momento e, além do mais, não anda lá muito disposta a apostar em sua criação a médio e longo prazo, obviamente com cada país da região exibindo características próprias em sua dinâmica política e na configuração das forças que a moldam. Mas as escolhas dos Estados Unidos são também extremamente importantes para entender o momento atual.

Os EUA, em aliança com a Comunidade Europeia (quaisquer que sejam as suas divergências menores), escolheram a Rússia pós-soviética como seu adversário da vez. Se no Oriente Médio, na medida em que não têm uma solução que garanta o controle da região, jogam na criação do caos pura e simplesmente, e no caso da China trabalham para manter fortes relações comerciais acompanhadas por um cerco militar, no que diz respeito ao país de Putin é uma vitória decisiva o que buscam, ainda que não esteja claro como se realizaria, em vista dos enormes armamentos nucleares russos. No que nos importa mais de perto, por outro lado, a normalização das relações com uma América Latina que vive impasses mais ou menos evidentes se mostra estrategicamente fundamental nesse cenário. O restabelecimento de relações diplomáticas com Cuba e a proposta de Obama de fim do bloqueio comercial ao país, as negociações de paz, já em sua reta final, entre o governo e as guerrilhas na Colômbia, os elogios à Bolívia e a retomada de boas relações com o Brasil – aconteça o que acontecer no futuro próximo – são parte desse jogo. Com Cristina Kirchner sucedida pela centro-direita do peronismo, na figura de Scioli, e Maduro na Venezuela isolado e com muito pouca margem de manobra, esse quadro se fecha (com Uruguai, Equador, Chile e Peru, além da América Central, não pondo problemas maiores para a política estadunidense). Desde que, é claro, essas parcerias renovadas se calquem em uma retórica mais branda dos EUA e nas debilidades que revelam os países latino-americanos.Tudo isso poderia se enquadrar em um recuo e reorganização organizados das esquerdas do subcontinente, nelas incluída a brasileira, de modo a reciclar-se e buscar uma nova ofensiva mais adiante. Não é isso, porém, o que vem se desenhando, o que de certo modo se complicou com os resultados eleitorais vitoriosos no Brasil no contexto do que vem, porém, se configurando em larga medida como um emparedamento e possível derrota política. Nesse contexto, cabe às forças populares se organizarem, com independência do governo e mesmo das forças partidárias dominantes. Em primeiro lugar, mais que defender o governo Dilma, trata-se de sustentar a democracia, contra qualquer tentativa golpista. Além disso, são cruciais a construção de uma agenda renovada, a reestruturação organizativa da própria esquerda e a rearticulação de uma coalizão progressista, de modo a converter este momento de crise e recuo em possibilidade de avanços em futuro não muito distante.

III. Em primeiro lugar, consideremos as bases sociais de uma coalizão capaz de retomar os processos de transformação democrática e social que marcam a história do Brasil da década de 1980 à de 2000. É comum nas esquerdas acusar-se a classe média de reacionária, denunciarem-se os “coxinhas” e artifícios semelhantes. Mas ou supomos que as massas populares têm força e devem bater de frente com as burguesias industriais, agrárias e financeiras que ainda fundamentalmente controlam nosso país, ou temos de pensar num sistema de alianças bem mais complexo. Ele precisa incluir setores significativos das classes médias, sobretudo das classes médias baixas, cuja situação vem em franco deterioro em especial nos últimos dois anos (como demonstram estudos de economistas como Waldir Quadros), com a distribuição da riqueza permanecendo intocada e salvaguardando os ricos durante toda a era Lula-Dilma (como pesquisadores como Marcelo Medeiros evidenciaram). Portanto, é imprescindível uma mudança de curso. Se na agenda atual não está posto o socialismo, temos de todo modo que buscar distribuir a riqueza controlada pelos ricos, ao mesmo tempo em que é necessário fazer com que invistam, como capitalistas, no desenvolvimento econômico do país. Não se trata obviamente de tarefa fácil, mas somente uma aliança popular com setores amplos das classes médias pode alcançar esse feito.

Assim, a ideia de uma frente de esquerda tem sentido, limitado, apenas no que se refere a contribuir, pela mobilização popular, a dar peso a certos temas essenciais da agenda pública. Além do mais, alianças amplas oferecem a maneira mais adequada de tirar a esquerda de um isolamento crescente, evidente sobretudo mas não exclusivamente em São Paulo. Servem também para neutralizar aventuras de uma direita que não tem conseguido, pelas vias partidárias normais, retomar o governo central, mas que pode vir a tentar fazê-lo utilizando-se de novos salvadores da pátria, demagogos que se apoiem nas infelicidades das classes médias descendentes e parte dos setores populares, que não são necessariamente esteios das forças progressistas. Seguir insistindo na oposição entre os “pobres” e o restante da população é receita certa, daqui para frente, para a derrota. Esse é tema real e identidade de grande parte dos brasileiros, mas se o Brasil é um país de trabalhadores, são muitas as suas variedades, que abarcam, além do mais, vastos setores das classes médias. Entregá-los todos nas mãos da direita é equivoco pelo qual pode-se pagar muito caro, o que é já bastante visível. Mais uma vez, quem atrair o centro político – partidário, mas também socialmente – terá vantagens no processo de resolução da crise. A esquerda não deve se autoisolar.

Que agenda pode sustentar novos avanços? O aprofundamento da democracia é decisivo. Apesar da retórica e de certo apoio aos conselhos participativos no estado, ele não vem figurando com centralidade na agenda das forças predominantes na esquerda. Ou se organiza e mobiliza a população, com alternativas de políticas de esquerda, democratizando-se o estado, dando-lhe transparência, combatendo-se a corrupção, abrindo-se os debates publicamente, e, sobretudo, reorganizando-se o funcionamento da política fora do próprio estado, ou não conseguiremos avançar. A democratização da esquerda é portanto também fundamental. O debate intelectual e político no Brasil contemporâneo é de uma pobreza extrema. Contra ou favor, no que toca a políticas de curtíssimo alcance, é o que se espera inclusive de intelectuais profissionais, sem espaço para um arejamento e ampliação de nosso horizonte, inclusive programático. Os esforços do MST e da CUT foram recentemente positivos, mas este é um caminho que apenas agora voltam a trilhar, As organizações políticas tradicionais da esquerda – partidos, sindicatos e semelhantes – mostram-se muito burocratizadas e distantes da população, sobretudo dos jovens. É imperioso mudar isso e impulsionar um processo amplo de mobilização que faça da participação algo real, que não se perca nos desvãos burocráticos do estado, e potencialize uma representação que seja ao fim democratizada por uma reforma que exclua o grande capital do jogo direto da política (com a proibição da doação por empresas), respondendo ao contra-ataque da direita, que quer fazer da reforma neste momento uma maneira de aumentar seu controle do processo político (com clareza, no entanto, de que esse é um jogo neste momento bastante arriscado). Isso ofereceria por outro lado alternativas ao anarquismo bastante tosco que, em diversas roupagens, tende a hegemonizar as manifestações urbanas e a introdução de novas gerações de brasileiros à participação política. A democratização da mídia não pode deixar de ser tocada aí, mas de nada adianta propô-la se a esquerda seguir escondendo-se atrás da denúncia da rede Globo e da grande imprensa, enquanto se furta a construir sua própria grande imprensa democrática, bem como a investir na televisão pública nacional e latino-americana (Telesul). No que tange às políticas econômicas e sociais, para começar uma solução diferente para a dívida pública é certamente necessária, baseada no crescimento e na queda dos juros, bem como o é sua revisão e a do próprio sistema tributário. Com o tributo que se paga ao capital financeiro por meio do sistema da dívida, é hoje impossível construir um estado do bem-estar social minimamente decente. A revisão da estrutura de impostos é imprescindível, fazendo-a progressiva, baseada na riqueza antes que nos rendimentos do trabalho. Os ricos devem suportar finalmente a carga tributária brasileira. Uma solução para o ajuste fiscal hoje até certo ponto necessário poderia desde agora tomar, com isso em mente, um rumo bem distinto do que o governo Dilma escolheu. A retomada da reforma agrária, que junte o financiamento generoso aos pequenos produtores e às cooperativas com a redistribuição da propriedade, tem de voltar à agenda da esquerda. Isso significa ao mesmo tempo negociação com o estado, em particular no que tange a recursos, e seu enfrentamento no que se refere à estrutura da propriedade altamente concentrada que temos no país, tencionando ao limite a coalizão governamental ora no poder, muito dependente do agronegócio. Obviamente, aprofundar e melhorar os programas de habitação popular, revolucionar a saúde e a educação, são tarefas que não deveriam esperar a próxima geração para se concretizarem. Que se aposente de vez, assim, o ilusionismo de uma “nova classe média” que, ascendendo da pobreza, poderia arcar com os custos dos serviços sociais e buscá-los diretamente no mercado. E que se vá além das políticas sociais liberais focalizadas nos pobres ou inclusive aquelas setorializadas (relativas em particular à raça e ao gênero), ainda que não devamos desconhecer sua importância, emergencial ou de longo prazo.

A retomada da industrialização brasileira, com um verdadeiro processo mais planejado de substituição de importações é decisiva, pelo menos em alguns nichos importantes, de modo a melhorar o tecido econômico do país e reverter nossa suave, mas permanente, descida aos infernos da reprimarização e ao que alguns chamam de “consenso das commodities” (que gostamos de ver nos países vizinhos, ocultando o quanto se expande também no próprio Brasil, com suas destrutivas consequências ambientais e sociais). Isso passa pelo empresariado privado, com o qual é preciso negociar de fato um modus vivendi que garanta seus lucros e investimentos produtivos, com uma baixa da taxa de juros que diminua os ganhos do capital financeiro, no qual os industriais parecem também enlaçados. Todavia, a necessidade de inovação econômica nacional, na qual eles não se mostram jamais interessados, terá de ser assumida muito mais diretamente pelo estado. Aí se põe a questão da recriação de empresas estatais, em diversos ramos, capazes de investir em novas tecnologias, em parceria com universidades e, quando possível, com as empresas privadas, mas mais isoladamente quando isso se mostre inviável. Essa é questão que, depois de tantos esforços de pouco resultado, precisa ser repensada, com novas soluções delineadas, não obstante os conflitos que se possam se pôr com o empresariado (sem falar de que esperar e concentrar todos os esforços nesse sentido no deslanche do Pré-sal parece ser uma má estratégia, embora a defesa da Petrobras dos ataques que sofre nesse momento seja evidentemente importante). Mais a longo prazo – ou seja, em termos estratégicos, que taticamente têm de ser traduzidos nos termos do tempo presente – é preciso alterar certos elementos que se encontram no cerne do atual modelo de “desenvolvimento”. A América Latina tem sido pródiga em colocar esse tipo de questão, desde os anos dourados da CEPAL, passando pela ideia de desenvolvimento sustentável nos anos 1990, com posteriormente ideias como “bem viver” e “viver bem”, supostamente de matriz indígena andina, emergindo nos debates sobre que tipo de sociedade queremos. Em nenhum lugar do mundo, mas em particular em regiões tão desiguais como a nossa, seria factível simplesmente abandonar o crescimento econômico em favor de algum tipo de sustentabilidade (como querem os que na Europa têm defendido o “crescimento zero”). A questão deveria ser posta de outra maneira: o que importa é que tipo de crescimento, com que relação com os seres humanos e a natureza, com que inovações tecnológicas, queremos. Do contrário, inclusive, entrega-se as populações em particular dos países menos desenvolvidos simplesmente à direita, que lhes promete bem-estar crescente com mais capitalismo e destruição (ainda que isso hoje muitas vezes venha com disfarces mais ou menos eficazes). Nesse sentido, a noção de “desenvolvimento sustentável”, apesar das indefinições e do mau-uso a que tem sido submetida, evidencia ainda grande potencial.De um lado, trata-se de desenvolver nossas economias e sociedades, de modo a alcançar uma relação menos predatória com a natureza. A questão energética sobressai aí, embora não se possa imaginar nenhum tipo de atividade humana que não tenha impacto sobre o meio ambiente. Novas tecnologias são imprescindíveis. Para produzi-las e disseminá-las, uma combinação entre formas de vida e produção ditas “tradicionais”, esforços de inovação estatal, mas também do “capitalismo verde”, são instrumentais, com forte regulamentação estatal globalmente coordenada. Mesmo que discordemos deste último, se esperarmos pelo socialismo ou outras radicais novas formas de vida para mudar nossa relação com o meio ambiente, é improvável que haja tempo para chegarmos lá. Entretanto, um segundo elemento é também decisivo. Trata-se de mudar nossas formas de consumo, desinvidualizando-as e desmercantilizando-as. Ou seja, tornando nosso consumo mais coletivo e reorientando a produção material – a começar pela indústria automobilística – no sentido de possibilitar esse giro civilizatório. Isso é evidente no que se refere às atividades e serviços típicos do estado do bem-estar social, como educação e saúde, bem como no que diz respeito ao transporte – público de qualidade em países que já atingiram padrões mais avançados. Mas é possível estender esse princípio a outras esferas, no que a imaginação e os movimentos populares podem ter grande papel a cumprir.

Quanto ao plano internacional, dois comentários devem ser aduzidos. Em primeiro lugar, isso tudo se potencializa se feito em parceria com os países da América Latina, levando o MERCOSUL a um estágio mais avançado do que o de mero mercado comum, no que seus limites são demasiados claros. É preciso avançar em ciência, tecnologia, políticas sociais, meio ambiente e, com os cuidados necessários, integração física. A responsabilidade do Brasil em projeto como esse, por seu tamanho e estágio de desenvolvimento, é enorme. Mais globalmente, é absurdo que o Brasil haja perdido protagonismo nos governos Dilma. Com a cautela necessária que nossa fragilidade atual recomenda, é imperioso retomar e aprofundar a busca de espaços de autonomia e desenvolvimento que de fato são possibilitados pelo aumento do multilateralismo na última década e meia.

A esquerda vai mal. Pode terminar até próxima da irrelevância. Ela precisa fazer um esforço para publicamente e sem amarras em pontos de vista partidários ou de organizações políticas semelhantes se renovar, no debate intelectual e programático, bem como nas lutas sociais. Os próximos anos serão muito difíceis, mas os que se lhes seguirão podem ser ainda piores se não fizermos esse esforço. Podem ser também mais luminosos se nos abrirmos para pensar o que seria efetivamente novo, em nossa contemporaneidade, na história do Brasil e do mundo, nos mobilizando pata tonar essas novidades realidade. Não há porque, sobretudo se buscamos um novo ciclo de mobilização e de giro à esquerda, evitar os conflitos. Mas é preciso fazê-lo com clareza de nossas forças, ampliando-as, e com uma agenda capaz de mobilizar vastos setores e atacar os problemas mais de fundo que se põem para o Brasil e, mais além, para nosso planeta.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

No dia do trabalhador, direitos em risco

JORNAL BRASIL DE FATO MG
Belo Horizonte, 01 a 07 de maio de 2015 | edição 85 brasildefato.com.br | facebook.com/brasildefatomg 


No dia do trabalhador, direitos em riscoPesquisa mostra que terceirizados ganham menos e se acidentam mais. No 1º de maio, trabalhadores vão pra rua contra PL 4330 (pág. 9)
Em Minas, organizações constroem 6º Encontro de Movimentos Sociais, que vai até dia 3 (pág. 6)
Integrante do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos Eliane Silva analisa cenário político (pág. 11)

Minas
Mobilizações pela educação
Escolas públicas e particulares mineiras param nos últimos dias. No Paraná, policiais ferem professores em protesto

Cultura
‘Malucos’ nas telas
Conhecidos como hippies, ‘malucos de estrada’ têm a vida retratada em série de filmes. Coletivo busca recursos para finalizar projeto

Variedades
20 anos de Malhação e a mesma história
Os cenários mudam, mas a novela insiste em enredos iguais

Brasil
Transgênicos sem identificação
Produtos geneticamente modificados não virão mais com rótulos

Esporte
Questão de Bom Senso
Calendário precisa ser equilibrado para garantir condições aos jogadores
Essas e outras matérias no link http://issuu.com/brasildefatomg/docs/edi____o_85_do_brasil_de_fato_mg - ou no PDF anexo.

Curta a fanpage do Brasil de Fato no Facebook e fique por dentro do que acontece em Minas Gerais: https://www.facebook.com/brasildefatomg.
Todas as edições do BF estão aqui: http://www.brasildefato.com.br/regional?tid_1%5B%5D=113.